Foto: Rodrigo Duarte/AMAZ
Quando o assunto é Amazônia, Denis Minev, CEO da Bemol e um dos investidores e fundadores da AMAZ aceleradora de impacto, é um interlocutor com experiências variadas e que compreende o papel dos diferentes players para impulsionar o ecossistema de impacto na região.
Minev foi Secretário de Planejamento e Desenvolvimento Econômico do Estado do Amazonas, ocasião em que ajudou a desenhar instituições como a Fundação Amazonas Sustentável (FAS) – da qual é Conselheiro – e o Museu da Amazônia (Musa).
É também um investidor anjo que toma riscos ao selecionar parte de seu portfólio de investimento por entender que isso é parte da busca de soluções de impacto positivo para a economia da região.
Embora reconheça que o ecossistema de impacto é ainda incipiente, Minev vê em iniciativas como a AMAZ um catalisador de negócios que podem impressionar pelo exemplo e pelo impacto positivo gerado e, assim, atrair olhares e investidores que percebam como essa nova economia pode gerar boas oportunidades.
Nessa entrevista concedida à AMAZ, Minev destaca a importância de aproveitar a onda de atenções voltadas à floresta para alavancar um desenvolvimento mais virtuoso, que olhe para a conservação da Amazônia, mas que também traga prosperidade às suas populações.
“Tivemos três ondas de atenção à Amazônia. Perdemos as duas primeiras, que envolveram Chico Mendes e Marina Silva. Houve queda de desmatamento, mas não aconteceu uma proporcional melhoria das condições de vida. Nosso papel é tentar aproveitar essa terceira onda, essa mobilização global que olha para a região com interesse, e tentar traduzir isso para o que seria uma visão de prosperidade na Amazônia.”
Como você avalia o ecossistema de impacto na região amazônica?
Denis Minev (DM) Tenho ainda a sensação de que ele é incipiente, o que me incomoda. E isso não é uma crítica aos empreendedores. Meu sonho é que o próximo Guilherme Leal (Natura) seja amazônico. Não estamos nesse ponto ainda, de ter essa qualificação entre os amazônidas. Então importamos. Uma coisa que eu esperaria dessa nova geração de negócios que estão sendo acelerados pela AMAZ é que plantassem essa semente um pouco mais profunda entre os ribeirinhos, com as comunidades com as quais têm contato, de modo a inspirar esse movimento.
O Idesam e a PPA (Plataforma Parceiros pela Amazônia) têm trabalhado nessa frente, e eu tenho trabalhado com o Idesam há alguns anos. É extraordinário o avanço. Mas é um avanço de uma base pequena, que ainda tem muito espaço para se desenvolver. Nós não temos, por exemplo, o empreendedor ribeirinho. Meu sonho é ter esse empreendedor, que saia lá da comunidade dele e consiga adquirir ao mesmo a educação suficiente e a visão de negócio, talvez influenciado por algumas dessas startups com as quais ele pode vir a ter algum contato.
O que é preciso para esse ecossistema se desenvolver mais rapidamente?
DM Acho que não dá para ser muito rápido, porque precisamos de exemplos. E não existe nada melhor de exemplo do que uma startup que dá certo. Então é preciso esperar elas darem certo para servirem de exemplo, para demonstrarmos que negócios sustentáveis de impacto na Amazônia são um bom negócio. Enquanto a gente não tem esses exemplos numa escala razoável, acho difícil acelerar muito. Tem gente que pensa em investir, mas não investe porque não está vendo a coisa acontecer. Para mim, a AMAZ é a tentativa do exemplo, é a gente apontar e mostrar que isso aqui dá certo.
E podemos fazer um pouco mais. Nas Chamadas de Negócio da AMAZ, vamos estimulando as pessoas a pensarem e a refletirem sobre como empreender. A AMAZ vai ser realmente impactante quando pegar pelo menos duas ou três dessas startups e elas tiverem um volume de sucesso razoável. Aí muda-se o jogo.
A Amazônia hoje está no centro das atenções. Como aproveitar esse momento para potencializar o desenvolvimento de novos negócios que gerem impactos positivos?
DM Hoje todo mundo só fala de Amazônia, é intenso esse movimento. Só que a pressão internacional não é pelo desenvolvimento da Amazônia, mas para proteger a floresta. Temos que buscar formas que estanquem o desmatamento e consigam melhorar a qualidade de vida das pessoas. E estamos aqui na AMAZ para equilibrar isso. Somos pequenos, mas se cada uma dessas empresas se multiplicar por 10, vamos ampliar o impacto.
Quando eu estava no governo do Amazonas, estava sendo criado o Fundo Amazônia. Minha sugestão para eles era criar um fundo de venture capital, ou que enviassem os melhores profissionais para cá, para desenvolvermos negócios e empreendedores. Mas eles acabaram fazendo um fundo filantrópico para conservar a floresta.
Você pode defender a floresta contra o desmatamento, mas é preciso atacar o desmatamento oferecendo alternativas. Isso é algo geracional, vamos levar pelo menos 20 anos para mudar essa chave. Essa onda de atenções para a Amazônia está ainda no começo, espero que seja longa e duradoura.
Na Concertação Amazônica, o que a gente quer é propor como podemos rematar a Amazônia nos tornando prósperos. Negócios como Inocas, BRCarbon e Floresta S/A, por exemplo, podem se tornar cases grandes, e se isso funcionar fortalecemos essa onda.
A AMAZ também serve como uma espécie de carimbo e abre portas para os investidores certos, que têm esses valores.
Você tem dito que estamos na terceira onda de oportunidades para mudarmos a chave de desenvolvimento da Amazônia, e que perdemos as duas primeiras…
DM Já houve ondas de atenção à Amazônia, estamos na terceira delas. A minha visão é que desperdiçamos as duas anteriores, que vieram com Chico Mendes e Marina Silva. Houve queda de desmatamento, mas não aconteceu uma proporcional melhoria das condições de vida, e aí se desperdiçam os ganhos. Acho que nosso papel é tentar aproveitar essa onda, essa mobilização global, que olha para a Amazônia com interesse, mas com um grau também de desconhecimento, e traduzir isso para o que seria uma visão de prosperidade com sustentabilidade na região.
Isso não pode vir de fora. Alguém de fora não vai conseguir imaginar o que quer dizer prosperidade na Amazônia. Olhar para um ribeirinho que hoje tem baixa educação, baixa expectativa de vida, e pensar nessa equação em como mudar a vida dele para que não precise mais de auxílio e consiga prosperar. Isso tem que vir da gente. E acho que essa construção é o que eu espero dessa onda de atenções internacionais. Que consigamos receber recursos e atenção e traduzir isso em prosperidade.
Os negócios de impacto são os melhores para aproveitarmos essa terceira onda. São também importantes para transformar a região e inspirar outras iniciativas.
O que seria a prosperidade amazônica?
DM Temos 25 milhões de pessoas na Amazônia brasileira. Temos ainda as outras Amazônias, vizinhas. Não é possível criar um cercado ao redor da floresta e tentar isolar essas 25 milhões de pessoas. É preciso encontrar uma solução, que vou chamar de prosperidade. Você espera que o seu filho tenha uma vida melhor que a sua e que o seu neto tenha uma melhor do que o seu filho. Não é nenhuma solução específica, mas é um princípio que deve reger também o tema ambiental.
Meu avô, Samuel Benchimol, que era um estudioso da região e costumava escrever muito sobre o tema, sempre disse que a Amazônia precisa ser tratada em quatro bases – economicamente viável, socialmente justa, politicamente equilibrada e ambientalmente adequada. Qualquer solução para a região teria que passar por essas quatro bases. E ele escreveu isso nos anos 1980, mas continua aplicável em 2020, e infelizmente isso ainda segue ignorado por grande parte das pessoas que interagem com a região.
>> Leia a entrevista com Antonio Ribeiro (Move Social) e Lucas Harada (Sense-Lab)
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